terça-feira, 30 de junho de 2009

A revolução quando chega é para todos

Anda toda a gente empolgada (ou não) com as novas tecnologias que prometem veículos eléctricos para o povo. Estes novos carros, puros e imaculados, não poluem, não fazem barulho, e são, nas palavras de José Sócrates "aquilo que as nossas cidades precisam" para resolver os seus problemas de mobilidade.

Nada tenho contra os carros eléctricos, pelo contrario, até estou também entusiasmado com o fim anunciado do domínio universal do motor de combustão interna. A questão que se põem é a mesma de sempre. O governo quando fala em mobilidade, só fala de carros. Dos discursos de ontem, estiveram de novo ausentes outros meios mais ecológicos, mais baratos e bem mais práticos de resolver o problema da nossa dependência do petróleo. Será que o governo nunca ouviu falar de bicicletas eléctricas? De scooters eléctricas? É que ainda por cima, estas existem de facto, estão a ser comercializadas neste momento, são práticas e de eficácia comprovada, ao contrario dos automóveis, que neste momento não estão a ser vendidos, não circulam, não existem.

Não estou a ver o português médio, completamente "dependente" do automóvel, trocar o seu VW Golf TDI por uma Vectrix. Mas quando é o próprio estado que parece favorecer o vício insustentável dos portugueses, esquecendo todas as alternativas, como vamos alguma vez sair da actual situação? Mesmo que 5 milhões de portugueses troquem o seu popó fumarento por um novo Nissam não-sei-das-quantas, que não polui (localmente) nem faz barulho, como é que isso vai resolver os problemas de estacionamento actuais? E os monstruosos engarrafamentos? Poupamos na factura energética, 30% segundo ouvi dizer, mas continuaremos com carros em cima dos passeios, carros na praceta, carros em segunda fila, carros em cima das árvores, carros para deslocações de 2 quilómetros, carros para o pai, a mãe, carros para os filhos e para o cão. Carros que estacionam sempre à porta, carros que cabem sempre e nunca estorvam porque "naquele passeio não passa ninguém".

Sim, a economia é muito importante. Mas desculpem se sou ingénuo e penso que a qualidade de vida dos cidadãos deveria fazer parte também das prioridades dos governantes. Aparentemente tudo o que tem duas rodas continua a ser, para o estado, uma excentricidade.

terça-feira, 9 de junho de 2009

No fundo, no fundo...

...eu queria era andar de bicicleta. Estou a falar a sério! Depois de me maravilhar com o BTT durante uns anos, comecei a meditar sobre um facto que me parecia extraordinário: conhecia muita gente como eu, que era capaz de pedalar 100 km no monte, num fim de semana, ou mesmo num dia. Mas não conhecia ninguém que fizesse os 10 ou 20 km para o trabalho durante a semana sem ser de carro... Porque haveria a bicicleta de ser só um instrumento de diversão? Certamente existia ali um potencial utilitário que ninguém estava a explorar.

A realidade das estradas portuguesas e a nossa nacional obsessão com o status explicam muita coisa. A verdade é que continua a ser um acto de coragem uma pessoa ir para a estrada numa bicicleta. Apesar disso, tenho reparado num aumento considerável do número de utilizadores de bicicletas utilitárias nos últimos anos, mesmo que esta seja uma apreciação feita a "olhómetro" e não esteja baseada em estatísticas.

Para quem eventualmente ignora os perigos envolvidos na condução de um velocípede na via pública, recomendo este vídeo simplesmente magistral, feito por um ciclista parisiense.

A realidade lisboeta/portuguesa difere "apenas" no facto de não existirem ciclo faixas, nem ciclovias, nem sinalização, nem... quase nada. Parece que as autoridades da capital começam a acordar para a questão, mas como em tudo, levamos já décadas de atraso. Eu acabei por me resignar a um uso ocasional da bicicleta para transporte. Uso esse que ainda espero incrementar. Termino com uma imagem da minha "scooter" a pedais, uma bicicleta dobrável da marca Dahon que por enquanto não substitui a minha CN. Ver aqui.

Não há duas sem três


Há alturas em que tudo nos acontece. Hoje, ao sair do trabalho fui dar com a CN já sozinha no parque. Infelizmente estava também marcada com mais um risco, oferta dos meus estimados colegas. Já a encontrei mudada de sítio, com um copo de café vazio em cima, mas a história dos riscos é um bocadinho demais. Não custava nada ter mais cuidado. Segunda feira vai haver bifes.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

O homem da gaiola prateada


O enorme Mercedes Benz atravessa as faixas a toda a velocidade e trava impetuosamente, mesmo em frente à minha CN. Estava a controlar os seus movimentos pelos espelhos, e tinha já abrandado, pelo que aquela paragem não chegou a ser tão perigosa como poderia ter sido.

"Lá vamos nós outra vez..." pensei para com os meus botões. Nos últimos tempos pareço atrair episódios de "road rage" de cada vez que me faço à estrada. Há menos de dois meses, acabei o dia num esquálido posto da PSP, depois de um condutor me ter tentado atirar ao chão, por várias vezes, no meu percurso para casa. O meu crime de lesa-vaca-sagrada foi ter buzinado para avisar este senhor que ele estava a fazer marcha a trás para cima de mim.

Desta vez, no entanto, a culpa era minha. Momentos antes estava a tentar furar uma fila de carros pouco cooperantes, na marginal, quando inadvertidamente dei um pequeno toque no espelho de um imponente carrão de cor prata. Medindo o impacto mentalmente, achei que não valia a pena parar. Admito que o facto de se tratar de uma viatura de tantos milhares de euros também pesou na decisão, não por temer o valor que tivesse que pagar por um eventual estrago, mas porque nutro um certo desprezo por quem possui tais artefactos num país tão pobre e injusto como o nosso.

Talvez o estimado leitor considere desde logo incorrecto que se ultrapasse e circule de scooter entre veículos imobilizados. Se for esse o caso, tenho pena de si. É verdade que é ilegal, mas votar também o era, não há muito tempo atrás. Se o português é comodista e insiste em ir a todo o lado sozinho na sua intocável gaiola-sagrada, entupindo e poluindo tudo à sua passagem, eu sou obrigado a esperar também? Não me parece.

No entanto, eu sou a minoria. Por todo o lado sou relembrado desse facto. Até pelos meus próprios amigos. Sou também extremamente vulnerável encima de uma scooter, no meio de maníacos protegidos na sua armadura de lata. Poucos facilitam a passagem. Parecem querem condenar todos à tortura diária que escolheram para si próprios. Alguns chegam mesmo a fechar a passagem, atirando o carro para cima de mim. Parecem acreditar que isso é uma forma de justiça. Se eles esperam, todos têm que esperar. E se eu acabar debaixo do carro, a culpa será certamente minha, já se sabe como as motos são perigosas, não é?

O pequeno homem sai do carro, furibundo. Diz que eu lhe bati e fugi, que devo ser parvo, que sou uma besta. Gesticula, está histérico, descontrolado. Eu estou muito calmo, "vamos lá ver o estrago" convido, ignorando a forma como aquele senhor de baixa estatura se estava a expressar. Olhamos para o espelho e não vemos absolutamente nenhum dano. Nada. Se eu já o esperava, ele parece surpreendido. Em vez de tomar conforto neste facto, parece ficar ainda mais agitado. Agora diz que tenho "merda na cabeça" e que vai atirar o carro para cima de mim. Sim, é isso, vai atirar o carro para cima de mim. Diz que os ricos podem tudo e ri histericamente. Permaneço em silencio. O pequeno homenzinho usa um casaco de malha e uns óculos de aros redondos, parecendo ainda mais frágil. Podia acalma-lo com alguma violência física. A ideia ocorreu-me. Mas para quê? "Homem, vá-se embora" acabo por dizer. E no meio de mais ameaças, vou-me eu embora. Ele salta para o carro e persegue-me por alguns quilómetros. Depois desiste.

Se lhe ocorreu porque não tenho escrito nada ultimamente neste blog, esta é a resposta: o que tenho para contar é tudo tão negativo, tão triste, que prefiro não o fazer. Nesta sociedade de 5,5 milhões de sagrados automóveis e mais alguns de pessoas ignorantes e preconceituosas, é difícil andar fora do rebanho. Esperando que nem todos tenham a minha experiência, e não querendo assustar ninguém que esteja a pensar fazer-se à estrada numa scooter, eu fico por aqui.